Pedras Rolantes

"A vida é aquilo que acontece enquanto estás demasiado ocupado a fazer outros planos" John Lennon



"You can't always get what you want, but sometimes, yeah just sometimes, you can get what you need" The Rolling Stones



sexta-feira, setembro 30, 2005

30.09.2005 - Bibliofilia: Charlie e a Fábrica de Chocolates

Ao contrário do que seria costume, depois de ver este filme, tinha que ler o livro. Ainda para mais sendo Roald Dahl alguém tão sardónico (pelo menos na escrita para adultos).
1º) Gostei e entranhei (é uma história dos anos 60, com alegorias às pastilhas elásticas e ao excesso de TV); é crítica subliminar qbp, mas escusava-se a lição de moral em letras grandes: ESTE MUNDO ESTÁ ASSIM PORQUE AS CRIANÇAS SÓ VÊEM TELEVISÃO E JÁ NÃO LÊEM. Ok, bem vindo ao passado (não havia X-Boxes...);
2º) Gostei das ilustrações esguias, não têm nada a ver com o psicadélico filme, mas o Willy Wonka está sempre a fazer o 4, e para além disso é velho;
3º) Quando Roald Dahl escreveu Charlie..., provavelmente ainda não havia Johnny Depp; Willy Wonka é completa e absolutamente cilindrado; o subplot do pai dentista ainda melhor (provavelmente também Tim Burton era muito pequeno);
Resultado Livro 1/ Filme 3. (E a culpa não é do livro)
Vou investigar o resto da literatura infantil de Dahl. Pode ser que tenha uma alegre surpresa.

quinta-feira, setembro 29, 2005

29.09.2005 - Somos todos (contribuintes) brasileiros

Lula! Meu amigo, meu irmão, meu po(l)vo.
Decerto deve conhecer um povão "tuga" (de portuga, como n' O meu pé de laranja lima), contribuinte, somos perto de 10 milhões, que abastecemos os seu jobs e boys (por aí acho que se chama mensalão), via PT, EDP, GALP, BES, etc.
E nem sequer temos dupla nacionalidade como a Fátinha, só essa portadora de vários sacos azuis.
Uma vez que o seu é o partido do povo (sem vergonha na cara), não acha que devia agradecer ao povão de contribuintes, que para além do mais, fizeram o favor de vos descobrir.É que só podíamos ter sido nós, à procura de um tacho.

quarta-feira, setembro 28, 2005

28.09.2005 - Quase na Patagónia

3º dia de trabalho pós férias. Apetece-me fugir.
A minha cadeira é dura. Não me sinto confortável.
Estou a modos que em piloto automático para protecção do próprio. E já não sei que pensar nem que agir.
Há mundos paralelos, com ou sem glaciares, com ou sem Chile, Terra do Fogo, Pablo Neruda, onde me apetece mais estar. Este cansa só de pensar.
Antofagasta, gosto deste nome, como Valparaíso. Arecibo, onde flutuam os maiores telescópios do mundo acima das nuvens.

27.09.2005 - Batman Begins - original motion picture soundtrack

Tudo em Batman Begins é diferente do normal, a começar pelo filme; isso será tema para outra conversa.
As boas músicas de cinema costumam cativar-me na hora, não é só a Amélie, o Fala com Ela e o De-Lovely porque são êxitos de vendas cá fora. Aliás De-Lovely esteve para aí 2 semanas nas salas e sinceramente não merecia. A música ainda menos.
Na hora, geralmente, conheço logo o estilo: John Williams, Thomas Newman, James Newton Howard, Harry Gregson-Williams, Hans Zimmer, Rachel Portman, até Alejandro Amenabar.
Infelizmente, sai-se do filme depois de ouvir bem os genéricos até ao fim e nos impregnarmos daquele sentimento, e geralmente o CD não existe ou custa para cima de 20 euros. Se isto é elitismo, vou ali e dou uma volta.
Com Batman Begins, aconteceu que me abasteci no amazon britânico, que para CDs/DVDs chega a sair mais barato que cá com portes e tudo.
Gostei porque percebi que a música era atípica, reconhecia estilos que não sabia quais e via asas de morcego a voar. Pelo que sei, não é frequente dois compositores associarem-se, e o CD não explica se há faixas de cada um, pelo que se presume que as 12 faixas foram trabalhadas em conjunto.
Hans Zimmer e James Newton Howard, o wagneriano neo-clássico (Batman, o herói) e o spooky neo-romântico (Bruce Wayne, o rapaz com medo). Misturam-se e entranham-se.
Nos temas de força (e estaleca) do herói, advinha-se a valsa e o render do gladiador, junto com um tema de fundo em violino que noutras faixas salta cá para fora e balança calmas dissonâncias. Claramente, trata-se de uma dualidade de caracteres a espelhar na personagem muito bem conseguida.
Todas as faixas têm crípticos nomes em latim ou latinizados (serão nomes taxonómicos de géneros de morcegos?). Mistério. Adoro. O primeiro e último som que se ouve é o bater de asas do morcego...

domingo, setembro 25, 2005

26.09.2005 - Bibliofilia - Pensatempos

Um Mia Couto diferente do literário: tratam-se de textos de opinião, publicados em revistas ou escritos para convenções. Posso dizer que me surpreende pela novidade de não por os Moçambicanos a falar por si próprios aquela língua tão feita de sonho, céu e África; aqui quem fala é o próprio, em português corrente.
Posso dizer que a capacidade de baralhar o alfabeto e dele saírem delícias de palavras para ler e para ouvir é uma das características de que mais gosto em Mia Couto. Aqui surge coloquial, colocando questões prementes sobre o futuro de África, sobre as relações entre Ciência e Literatura (o que mais gostei), sobre a sua visão do mundo e do seu próprio país (algumas farpas bem lançadas).
Penso que o problema recorrente da identidade Africana se põe a qualquer povo que tenha um número de etnias suficiente esmagador. Portugal é o paraíso dos santos, Homo lusitanus (excepto alguns transviados como o Ti Alberto João). Já Espanha tem galegos, catalães, bascos, cada um a puxar a sua meia. Imagine-se agora a Europa inteira, onde fica o nosso Europeísmo? Só se fôr mesmo na comissão. A característica da Europa é ser Velha.
A característica das Américas é serem um melting pot, um caldo, uma mistura de água com azeite, é a procura da própria identidade.
África é muito diferente, está dividida em muitos países, fronteiras geográficas das ex-colónias, que não traduzem minimamente a sua etnicidade; África é diversidade, e fome e doença também, e sobretudo um sentimento de indignação pela diferença.
Por alguma razão, Moçambique já não é oficialmente PALOP, Moçambique não existe. Existe Mozambique, membro da Commonwealth. E isto diz tudo.
Quanto ao resto, apesar de tudo, uma vez que têm que haver dois, gosto mais do outro Mia.

25.09.2005 - Acabou-se

Acabaram-se as "férias grandes", que as restantes são pequeninas.
Começa tudo outra vez; será ?
Não poderá, por uma vez começar melhor, as pessoas mais animadas, as notícias serem boas? I'd wish...

sábado, setembro 24, 2005

24.09.2005 - Cinefilia - Um Homem Chora

(visto em DVD -série Y - Público)
Tinha tudo para ser um bom filme: Sally Potter, a realizadora de Orlando; um quarteto de bons actores (dos quais quanto a Cristina Ricci, tenho as minhas dúvidas que fosse a mais forte para levar a história "às costas"); uma música (cigana e "operática") excelentes, um cenário natural invejável, que é Paris e uma boa fotografia. Mas acaba aqui.
O principal problema é a história - não existe. Há panfletos levantados aqui e ali a favor da minorias étnicas. Há um único rumo, uma fotografia, que atravessa o tempo, e que acaba por tirar protagonismo à história principal. Há personagens que vão desaparecendo à medida que vão deixando de ser necessárias.
Finalmente, quem é o homem que chora (uma vez que Cristina Ricci é quem carrega o fardo de ser uma outcast, onde quer que esteja)? Dante (John Turturro), ao implorar à virgem que ajude os alemães a conquistar Paris, a cantar ópera? Cesar, por saber que se vai perder e perder a mulher que ama? (Johnny Depp é sempre impecável, embora muito subvalorizado neste caso)? Abramovitch (o pai que deixou de acreditar em Deus), ao ouvir a filha cantar? Os três? Porquê?
Estilo só não chega, quando chegamos ao fim e vemos que não restou absolutamente nada.

23.09.2005 - O inimigo público

Por coincidência, faz hoje 2 anos o suplemento Inimigo Público, que sai com o Público às 6as feiras, e é uma das poucas sátiras que me faz rir com o descalabro deste país.

Mas do que eu queria mesmo falar é do Inimigo Português ao volante. Mal a chave entra na ignição e o pé se apodera do acelerador, nasce um exterminador com poderes assassinos, melhor dizendo, uma besta.
A ataxia ("gait", desquilíbrio, descoordenação motora) que nos guia pode ser facilmente comprovada nos supermercados: estacionamento em filas múltiplas, choques frontais... E não é inexplicável.
Tem a ver com a nossa profunda falta de civismo (os nossos direitos acabam onde os dos outros começam, mas que culpa temos nós de eles começarem tão longe?), com o nosso profundo analfabetismo funcional (saber ler e escrever não nos habilita a saber funcionar, prova disso é que a grande maioria dos condutores chumbou várias vezes no exame de código antes de conseguir (perceber) tirar a carta (que pode ser suavemente aliviada em suaves prestações, na direcção geral de viação); finalmente a falta de vigilância por polícias ineptos que só pensam em cifrões e não no bem estar no cidadão, que deveriam passar o exemplo de rectidão (obviamente não existe, e se existir, pode ser comprado).
As barbaridades em auto-estrada, em povoações, em estradas nacionais ou regionais, na cidade, são tantas que se tornaram inomináveis. Os nomes com que os condutores se presenteiam também.
O mais difícil, para mim, de encaixar, são os quilómetros de contramão na auto-estrada: como é possível permitir? O que é que pode levar alguém de seu inteiro juízo a fazê-lo?
Bem sei, o vinho é amigo do português ao volante (e fora dele), e "julga-se o melhor condutor do mundo..."
Pergunto eu, E Depois?

quinta-feira, setembro 22, 2005

22.09.2005 - Bibliofilia: Uma Casa no Fim do Mundo

Michael Cunnigham parece ser perito em famílias disfuncionais, como já o demonstrou em As Horas.
Este romance, contudo, é anterior, data de 1990 e segue o precurso de Bobby e Jonathan, que se intersecta com Clare e Erich, a tempos diferentes, formando círculos de relações humanas, que todas as personagens desejariam que fossem estáveis e eternos, mas que acabam sempre por fracassar: com Clare, porque não aguenta viver numa "casa no fim do mundo" (em Woodstock), com uma filha que quer possessivamente sua (todos os pais são extremamente possessivos para Cunningham) e longe do(s) pai(s) - biológico e emocional; com Erich, que está a morrer com "aquela doença inominável" dos anos 80.
Jonathan e Bobby, pessoas que sempre andaram à procura do seu Nirvana pessoal, acabam por ser os alicerces da tal casa, ainda que só no final pareçam começar a dar-se conta disso. Na atmosfera, sente-se a tristeza das infâncias infelizes, dos planos de que se abdicaram, daqueles em que nunca se pensou.
Falta-lhes uma bússola em que nunca pensaram.

21.09.2005 - Escrever sem rede

Pensei, nas férias, uma vez imposta a greve de net, escrever à mão ou até em ficheiros word os temas para os vários dias que se iam acumulando.
Não o fiz, prefiro escrever no momento, de net ligada e tudo.
Já perdi posts por causa da net cabo, mas remediou-se.
Assim tem mais piada, log on.

20.09.2005 - Fine tuning, o abismo

Já vi, pelo menos, umas mil reportagens sobre essa actividade altamente altruísta que é o tunning, em que uns quantos assassinos (condutores portugueses) ainda afinam mais o 2 cavalos para ele poder andar a 300km/h na Vasco da Gama, 24 de Julho e outras pistas de corrida pelo país.
Obviamente são pessoas que têm um grande conflito com a própria vida, e como tal, deviam espetar-se directamente contra uma árvore (que ainda é um ser vivo), ou melhor, contra um poste de alta tensão.
Infelizmente, quem eles matam quase sempre são os condutores que julgavam conduzir numa avenida ou auto-estrada e subitamente se vêm confrontados com um foguetão (de sucata, porque geralmente o tunning é do motor, aumentar cavalos, e não do sistema de travagem e segurança).
A polícia, como não tem carros como os deles, faz que não olha; obviamente, têm medo, o que só lhes fica bem.
Vem isto a propósito da "hora de ponta" (de Setembro) na Aveniada Nações Unidas em Telheiras (!).
Dois carros andaram aos zigues e aos zagues, completamente absortos na "sua corridinha", no meio do trânsito congestionado e de alguns sinais vermelhos, fazendo aquelas alegres diagonais para a fila mais à esquerda, mais à direita ou como lhes aprouvesse.
Eram seis e meia da tarde.

19.09.2005 - Cinefilia: Cinderella Man

Os críticos de cinema não gostam de Ron Howard, é como se fosse uma espécie de tarefeiro de serviço. No entanto, deu-lhes recentemente para começar a elogiar Apollo 13 (!).
Por acaso, gostei de Willow na terra da Magia, de Apollo 13, de Uma Mente Brilhante e de Cinderella Man (agora não me estou a lembrar de mais nenhum). Por acaso, não acho que nenhum deles seja moral ou politicamente pró ou contra-americano (está tão na moda), antes pelo contrário - incrível - contam todos uma história com princípio, meio e fim, com pessoas normais (ok, ou elfos, ou esquizofrénicos) a tentarem vencer as adversidades.
Nesse sentido, Howard, foi sempre herdeiro do classicismo do cinema, dos anos 30-50. Pode ser um average director, mas sabe-se rodear pelas pessoas certas, e isso é muito bom. Mais, na maioria dos casos, sabe-se guiar por bons argumentos (o que não é muito comum hoje em dia, mesmo no mainstream).
Antes pelo contrário, os kid directors dos anos 70 podem dar-se ao luxo de entrar em piloto automático e esperarem os óscares (Aviador, Guerra dos Mundos).
Cinderella Man é um filme simples e lógico, acerca de pão, leite e sorte. Pelo nome, já é Capra-esco - o Homem Cinderela, ou o Cinderelo... que por acaso era boxeur. A história continua a ser a luta contra a fome, a desagregação da família, a pobreza, o frio, e depois um tremendo golpe de sorte (mas com muitos murros à mistura).
O inesperado é que o omnipresente Jimmy Stewart já não existe e teve que ceder lugar ao mais inesperado dos seus herdeiros (Russell Crowe); os diálogos com o treinador (Paul Giamatti), são de antologia em Capra (anos 30), atmosfera que flutua em todo o filme, captado num granulado que lhe altera as cores (para mais escuro ou mais claro) e nos flashes que se sucedem no ringue.
Fabulosa também a música de Thomas Newman, como sempre.
Não é um weepie, Jesus e como eu gosto de weepies, mas há muito tempo que não saía de um cinema a sentir-me tão bem.

17.09.2005 - Bibliofilia: O Livro de Cesário Verde

Já conhecia Cesário, obviamente, dos tempos do Português 11ºano (sim, chegámos ao Cesário, melhor dizendo, até chegámos ao Fernando Pessoa!), nomeadamente, O Sentimento de Um Ocidental.
No ano em que se comemoram os 150 anos da sua morte, foi dada alguma (pouca relevância) nalguns jornais de referência, e decidi rever e alargar os meu conhecimentos.
Há uma frase de Oscar Wilde que diz que felizes são os que morrem cedo, porque é deles que os deuses gostam. Acrescento, e os infelizes mortais também. Todos os mortos prematuros têm uma aura de invulnerabilidade estilo, ainda tinha tanto por fazer.
Não sei se tinha ou não, confesso. Tirando o poema supracitado, por demais glorificado, e alguns outros também de pendor realista, mas sempre em rima clássica, parece-me um romântico com traços muito, muito ténues de Poe, com ciprestes e cemitérios (no entanto, nada de Nevermore), a deixar ir-se na onda, tão depressa descrevendo o decote de uma das amadas, como o homem que morreu nas obras. Não me parece bem, quem sou eu?
E depois o pendor tipicamente hipocondríaco do filho de famílias burguesas que fugiram in extremis para o Lumiar, quando da epidemia em Lisboa, "o Cólera, a Febre", essa hipocondria, que mais que a tuberculose, o perseguiu toda a vida, assim como os pontos de exclamação.
Seria de esperar mais? Para mim não, fico por aqui.

18.09.2005: Aujourd'hui, c'est moi

Hoje nasci, terna coincidência, nasço todos os dias neste ano desde o ano da Revolução / Evolução (?).
Hoje foi um dia calmo, com sol e calor. Vim do Vimeiro, observando aqueles gigantes eólicos do parque energético do Oeste, e sentei-me, em minha casa. Senti-me bem. Voltei a ter internet. Fui ao cinema. Tive prendinhas.
Sinto-me bem, quase feliz.

16.09.2005 - Mar Adentro (1)

" Os Sonhos


Mar Adentro, mar adentro,
e na fluidez do fundo,
onde se cumprem os sonhos
juntam-se duas vontades
para cumprir um desejo.

Um beijo incendeia a vida
com um relâmpago e um trovão,
e numa metamorfose
o meu corpo não é já o meu corpo;
era como penetrar o centro do universo;

O abraço mais pueril
e o mais puro dos beijos
até nos vermos reduzidos
num único desejo;

O seu olhar e o meu olhar
como um eco repetindo sem palavras:
mais fundo, mais fundo,
mais além de tudo
pelo sangue e pelos ossos.

Mas acordo sempre
e sempre quero estar morto
para continuar com a minha boca
enredada em seus cabelos."

(Voz de Javier Bardem, em galego, sob fundo com gaita de foles; mar azul)

15.09.2005 - Férias de workaholic

" O Poema que tomou o Lugar de uma Montanha


Ei-lo, palavra por palavra,
O poema que tomou o lugar de uma montanha.

Ele respirava no seu oxigénio,
Mesmo quando o livro jazia voltado sobre o pó da mesa.

Recordava-lhe o quanto tinha precisado
De um destino para o seu próprio rumo,

Como tinha reordenado os pinheiros,
Movido as pedras e escolhido um caminho entre as nuvens,

Pela perspectiva que mais lhe convinha,
Onde se achava inteiro numa inexplicável inteireza:

A exacta rocha onde as suas inexactidões
Descobriam, por fim, a vista para a qual tinham avançado,

Onde poderia deitar-se, fitando o mar lá em baixo,
E reconhecer a sua única e solitária casa."
Wallace Stevens
Lindo.

14.09.2005 - Pré-pré-qualquer coisa

Vi na SIC Notícias um debate estupidificante. Duas pessoas (nem lhe vou chamar senhores, e mesmo assim, acho que pessoas é ofensa para o resto de nós) ofenderam-se mesquinhamente, procurando as rasteiras pessoais mais subreptícias para picar o próximo.
Era suposto ser um debate sobre a minha cidade, Lisboa, que tem muitos problemas sérios; não se espremeu um pingo de ideias, só malcriação.
Por um lado, não sei se pelo convívio com o absolutely lorpa ex-tudo Santana Lopes, do outro, porque se calhar já nasceu assim e o botox lhe bloqueou o neurónio.
Apetece insultá-los a eles por fazerem coisas tão sérias caírem a um nível tão baixo.
Provavelmente o casino vai abrir em cima do Parque Mayer do Gehry à saída do túnel do Marquês , que passa a 1 metro (!!!!!!!) do túnel do metro. Sorte a deles que o ano é de seca, porque dos ribeiros estrangulados por baixo do betão de Lisboa, não ouvi ninguém falar.
E depois aparecem cartazes ridículos, em Oeiras a prometerem Wi-fi em todo o concelho (?), e o inevitável Isaltino.net.
Vergonhas são também Gondomar, Felgueiras, Amarante, onde quem vai ganhar merecia era ver o sol aos quadradinhos. Será que o povinho também gosta assim do Carmona e do Carrilho? Capazes de os defender com unhas e dentes?
Eu sentia-me antes mais apta a defender a minha cidade, não sei bem é como.

13.09.2005 - Queer eye for a straight guy

(programa homónimo da NBC)

Está na moda
Metrossexuais
Homosexuais
Tias
Decoração de interiores
Programas Big Breda que fariam Orwell corar de vergonha
Supostas celebridades casadas com múmias e aspirantes à nobreza (pelo lado do Michael Jackson). Sim, é o CASTELO BRANCO.
Homens vestidos de mulher com fatos drag cor de rosa e voz de falsete
Pelotões de celebridades que já andaram a emporcalhar-se numa quinta

Sim, é esta a televisão que merecemos. Vou fazer greve e quero dedução no IRS.

12.09.2005 - Pequenos crimes entre amigos (há um ano morreu Joana?)

Há um ano uma mãe chorou porque lhe desapareceu a filha (mas chamou a televisão).
Há um ano que não se sabe da Joana, presumivelmente morta.
Há um ano que mãe e tio fintam a PJ com histórias absurdas.
Há um ano que a PJ investiga e acredita em todas as suas histórias.
Há um ano que não chegam a lado nenhum, nem encontraram o corpo da vítima.
Há um ano que presumivelmente a mataram, cortaram aos bocadinhos e deram de comer aos porcos...Ou presumivelmente Joana desapareceu porque foi vendida a quem ofereceu mais para o desse e viesse.
Uma filha perdida é telegénico.
Uma filha assassinada e dada com alimento a animais não é. Tráfico de crianças também, pero que lo hay, lo hay.
Está tudo em tribunal, o que quer dizer que daqui a nove anos deve prescrever.

11.09.2005 - cento e dois minutos (por extenso)

Já passaram 4 anos, mas parece mesmo que foi ontem, aquela vontade de parar e de me esconder debaixo de um sofá. Aquele magnetismo incrédulo do ecran onde dois aviões em natação sincronizada davam o seu mergulho sobre as gémeas.
É um dos meus tabus, uma das coisas que me prende o pensamento e a escrita, pensar no inferno, não na infâmia. Porque não foi o dia da infâmia, foi o dia em que descobrimos o fundo bem fundo da maldade humana sem sentido e teleguiada.
O que não podia acontecer, aconteceu, e acontece agora, todos os anos.
Conhecia a Torre Norte, penso eu que foi nela que juntamente com enxames de chineses subi até ao 109º andar (Windows of the World), estarrecida, e vi o Empire State, pequenino, lá ao fundo. O hotel em que fiquei, o Marriott, entre as 2 torres, também se foi. Estive lá há 5 anos.
Agora resta uma cratera sem fim.
Foi lançado agora um livro, 102 minutos (o tempo que mediou o 1º ataque e a última queda), de Jim Dwyer e Kevin Flynn. Está na minha lista.
A sério, parece que as torres eram minhas e o ataque me foi dirigido, embora nem sequer apreciasse o seu estilo arquitectónico. É este o meu sentimento de uma ocidental. Perda.

10.09.2005 - Greve de net!

70 km de Lisboa, sítio civilizado, portanto.
Não há net à vista, cyber-cafés nem vê-los.
Parece que há num hotel, mas só nos quartos. A entrada, para quem vai para a piscina quente, tem wi-fi.
Pergunto - Há assim tanta gente "sem fios"? Querem por Oeiras wireless (promessa pré-campanha eleitoral); não seria melhor primeiro ensinar-nos a escrever e a usar a internet convencional?
No nosso hotel, a rede telefónica não suportava sequer baixa velocidade. Seremos subestimados ou subdesenvolvidos (ou ambos?).
Vimeiro, Set/05

09.09.2005 - Vento

Kite
Papagaio
Parapente
Falésia
Gaivotas
Vento
Eclipse da gravidade
quando se flutua e rebola no ar
quase parado
fintando pássaros de asas longas
deitando longos acenos ao mar
acariciando os estratos das rochas
e o vento que te eleva e te mantém.

07.09.2005-Cinefilia: Sideways

(visto em DVD de aluguer porque não tive tempo, embora tivesse muita curiosidade, de o ir ver ao cinema)
Merlot, pinot...
Curioso, o temperamento das uvas, como crescem, como gostam da água e do sol de maneiras diferentes. Sou do país do vinho e não percebo nada disto; quer dizer, agora e com a ajuda de Alexander Payne, já percebi a relação entre as uvas, provas de vinhos e relações humanas.
About Schmidt tinha sido avassalador, devastador, com um excelente Jack Nicholson over the edge (as usual). Com Sideways temos outro exemplo de relações fracassadas, frustrações e capachos que não desaparecem. As personagens são todas secundárias e servem a história de Paul Giamatti, o professor/escritor em crónico e ambulatório estado depressivo. É ele que move o xadrez, que arma os conflitos, ao ter que assumir tudo o que o seu bom amigo não assume nem nunca assumirá. A esperança final reside nele e é com ela que nos despedimos.
Paul Giamatti, I'm watching you!

quinta-feira, setembro 08, 2005

08.09.2005 - O Resto é província (sic)

Dizia o amigo Eça que o país é Lisboa e o resto é província. Se fosse seu contemporâneo, Pinto da Costa tinha-lhe ido aos gasganetes e enfiado Uma Família Inglesa pela goela.
Mas em grande medida, concordo com o amigo Eça. Lisboa é um mastodonte ingovernável, logo único local possível para o Governo trabalhar.
Descontando a Invicta, a 3ª cidade do país é Coímbra, onde o trânsito já é impossível, mas também é dificil encontrar a sede do posto de turismo (como em muitas outras cidades portuguesas, devia ser bem sinalizado) e já se nota uma certa confusão de infra-estruturas (embora tenha a Universidade mais antiga!).
Algarve à parte, que foi construído para turistas estrangeiros, a menos de 100km de Lisboa desaparecem cyber-cafés, postos de ligação à net (não precisam ser wi-fi; porque não uma simples ficha RITA?), postos multibanco, supermercados. Desaparecem.
Há 15 anos, quando os telemóveis eram miragem, fazia-se à noite bicha (no Algarve profundo), que dava volta ao quarteirão, para falar para casa na única cabine telefónica da região.
A maioria das casas de férias continuam a não ter telefone. Vá lá, já têm luz e água canalizada, mas provavelmente a construção é ilegal segundo o PDM da zona.
Quando deixaremos de ser tão analfabetos?

terça-feira, setembro 06, 2005

06.09.2005 - Ultraje!

Fui "spamada", uuugh. Tenho anúncios de propriedades, de programas anti-spam(!), de sites "to date good chicks", etc...
Quando for crescida hei-de dar-lhes um tiro. Estragaram-me a fotografia...

05.09.2005 - O Verão acaba quando um Homem quiser

"E se fores esquecido pelo que é terreno,
à terra em repouso diz: Eu corro.
À água rápida diz: Eu sou."

Já se fala no regresso às aulas, professores, alunos; no meu tempo era Verão até 1 de Outubro.
Agora já estamos no Natal.

06.09.2005- Cinzas

Somos filhos de um país queimado; cada ano que passa parece que o verde se esbate e ficamos inexoravelmente mais perto do Sahara.
Com a agravante de este ano nem sequer ter chovido e os portugueses, precavidos como são, terem deixado as barragens e albufeiras chegar à quota mínima.
No Algarve já ultrapassaram os mínimos, provavelmente porque têm muitos campos de golfe para regar e os senhores hooligans ingleses (que partem tudo ao som da cerveja quando a equipa deles está a perder) têm que ser bem tratados, agora o gado e a agricultura que se liofilizem.
Cada ano que passa os 4 canais nacionais banalizam, ao ponto da incoerência, as matas e o mato a arder, as casas que se perdem, o gado que morre queimado, as pessoas em histeria, os bombeiros cercados pelas chamas, sem água, sem comunicações outras que não o seu próprio telemóvel, sobretudo, sem nenhuma coordenação.
Este ano muitos sítios havia já onde não chegavam bombeiros e simplesmente se deixava arder, até que o vento mudasse, viesse a chuva ou já não houvesse combustível.
Criticam-se as nossas florestas, pinheiros e eucaliptos. Diz-se que há lobbys e pirómanos. Prende-se arraia miuda.
Muda-se de ano, vira o disco e toca o mesmo.

04.09.2005 - Beslan, algures na Ossétia do Norte

Aconteceu no ano passado, mais ou menos por esta altura, num sítio que eu nem sabia existir.
Aparentemente era a festa de reinício do ano lectivo, que rapidamente descambou em crise com muitas crianças reféns e a característica falta de tacto de Putin posta em causa. Lembro-me de terem dito que o negociador era o mesmo do teatro de Moscovo (que acabou extremamente bem, sobretudo em número de almas penadas). E pasme-se, o negociador é (ou diz que é médico); deve ser da safra do Mengele.
Obviamente, nós, as almas "ocidentais" e "desenvolvidas", estávamos a ver quando é que aquilo ia acabar mal, sentados no sofá, à frente da televisão, por volta das 20h. Não dava nada. Crianças e adultos semi-nus, com fome, sede e medo, sem saberem exactamente porquê eles.
É a triste verdade do terrorismo moderno: é bruto, inesperado, estúpido, não escolhe, mata (convém ser em quantidade e em estilo, de preferência televisivo); é cínico e fundamentalista, com o objectivo de nos tornar a todos ovelhas aterrorizadas acéfalas que prescindam dos seus direitos de cidadania a favor de protecção.
Por isso não me choca que os principais grupos terroristas sejam comandados ou estejam associados aos manda-chuvas do momento - já que não nos convencem pela inteligência e argumentação (mas sim pela sua falta), convencem-nos pelo medo.
Vi adultos a chorar com crianças de cuecas ao colo; aparentemente, os disparos começaram, não se sabe ainda hoje porquê, nem quem disparou primeiro.
Beslan vai diluir-se, não no fundo do mar de Behring, mas na indiferença e na apatia dos tribunais.
Nunca haverá culpados por apontar metralhadoras a crianças da 1ª classe.

sábado, setembro 03, 2005

03.09.2005 - Dentista em cadeira

Fui tirar um molar; o meu último siso, meio resistente, meio incluso, meio cariado (isso mesmo, três metades). Doía-me de bradar aos céus, acalmado por um batalhão de analgésicos e antibiótico.
Experimentei todos os instrumentos de tortura: aquela coisa para libertar o dente da gengiva, vários tipos de alicates (chamam-se "vaquinhas" - coitadas), várias injecções de anestesia. A coroa partiu-se e lá veio a broca de partir mármore, som horrível (na analgesia já não sentimos, mas o som é de por os cabelos em pé), finalmente, la pièce de résistance, uns instrumentos muito parecidos com saca-rolhas.
As raizes eram tortas e não queriam sair. Estive mais de uma hora na cadeira, com suores frios.
Foi-se o meu último siso, com luta.
(Não tenho nada contra dentistas, mas este post devia ter bolinha vermelha)

02.09.2005 - Katrina

Nova Orleães é uma cidade submersa, pela água, pelo ferro e pelo fogo.
Fez bem quem se trancou em casa, embora não seja politicamente correcto dizê-lo. Se a casa tem espaço qbp acima do nível da lama, antes molhado que arrombado.
Dizem que nem é bem água aquilo que os diques deixaram para trás, sim uma emulsão de líquidos gordos, putrefacção e excrementos.
Nos recintos de fuga reinam as pilhagens e tentam-se abater helicópteros de salvamento.
A família Bush, como sempre atrasada, dispara as piores bujardas da época.
E a Administração Central, o Governo Federal, o Centro de prevenção de furacões. Foram assaltados pelo Bin Laden, enquanto o tio Bush estava nas suas sagradas 5 semanas de férias?
É no que dá ignorar sistematicamente protocolos ambientais e ser uma das nações mais poluentes do mundo (and proud of it, texan accent).
Não estavam preparados, não tinham coordenação; demitiram-se, cobardes e fugiram.
Imaginam se isto tivesse acontecido nas Torres Gémeas? Mas a Louisiana não é um icon dos states, é mais uma mistura crioula diferente dos ideais WASP fundamentalistas daqueles que rodeiam o presidente mais cretino de que há memória.
O que se seguirá mais, não sei, mas não vai ser bonito.

quinta-feira, setembro 01, 2005

31.08.2005 - Cinefilia: A Intérprete

(visto em DVD de aluguer = o bruhaha não me convenceu o suficiente para ir ao cinema)

E absolutamente panache, glamour. Sidney Pollack pode estar em África (Minha) ou em Nova Iorque - o exercício é de estilo e bom gosto. Bateu Hitchcock aos pontos, uma vez que conseguiu convencer Kofi Annan a deixá-lo filmar dentro do Edifício das Nações Unidas.
E realmente, Nova Iorque parece radiosa, vista do Hudson, assim como a ONU, que parece sinceramente menos cinéfila se apreciada pelo lado da Grand Central Station.
Depois há a intriga (internacional), o eterno (realmente) McGuffin, uma vez que o plot político se vai desfazendo aos nossos olhos. As personagens principais, com muita amargura no cadastro, ditam umas pérolas de sabedoria africana, que nos remetem à outra África (Minha). Sean Penn está cada vez mais parecido com o Clint Eastwood de agora (na interpretação contida). Kidman também bem, permanentemente inquieta.
Thriller com estilo anos cinquenta, actualizado, não estranha e entranha. Boas pipocas. É bom rever Nova Iorque tão bonita.

30.08.2005 - Serviço de Urgência

O princípio da entropia.
No outro dia vi um episódio de E.R., na sua enésima série. Basicamente, continua tudo igual, mas tudo diferente. Ao princípio parecia-me tudo demasiado limpo e organizado. Agora não. Não sei se foi efeito das Grandes Catástrofes Não Naturais (11 Setembro), mas as urgências deles são mais caóticas, mais iguais ao que deveriam ser (ver, ou ler, Por um Fio, sobre a vida de um paramédico literalmente à beira de um ataque de nervos, neste caso Nicolas Cage, antes das GCNN).
Evidentemente com ou sem protocolo de Manchester, as urgências são mesmo assim. As Emergências (urgências mesmo urgentes), consistem desde o primeiro segundo numa catrefada de médicos e enfermeiros a tentar fintar a morte de alguém cuja história (clínica) na maior parte das vezes desconhece.
É um dever. É um reflexo condicionado. É a campainha dos directos para a Medicina (há vários sítios, dentro e fora do hospital, com campainhas iguais, que me arrepiam, embora ainda me arrepie mais o som do "meu" bip, que é reproduzido por muitos outros, dentro do hospital, e por alguns telemóveis, fora).
Perante isto, as restantes "urgências" resumem-se à sua insignificância: na grande maioria, a ineficácia dos cuidados de saúde primários para cuidar dos "utentes", transformando-os nos nossos"doentes". Mas isso é política, falta de médicos, e tema para outra conversa.

29.08.2005 - Tsunami

O Mundo Depois de Amanhã


(acerca do Tsunami no Índico, que matou tanta gente, tão longe, logo a seguir ao Natal passado e poupou uma camisola da selecção nacional - com criança dentro)
Quando será que o Homem aprende que a Terra em que vive é emprestada da geração passada, e seria suposto entregá-la como testemunho à geração seguinte?
Não temos respeito pela terra que pisamos, pelo mar que nos rodeia, pelo ar que respiramos. A Terra vive sem nós. Nós não vivemos sem a Terra (apesar da ficção científica ser no fundo um complexo de Deus).
A Terra tremeu e o mar agitou-se, e assim continuará até que o Homem perceba que é apenas um peão e não um dos jogadores. O melhor que faz é manter-se informado da próxima jogada e tentar evitá-la.
Ma em vez de tentarmos perceber a nossa velha casa (que temos por demais como imutável), já se fala em voltar à lua...
E o barril de petróleo? E as correntes do Golfo? E o El Nino?
"How fragile we are..."
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...