E se um dia ou uma noite um demónio imperceptivelmente se arrastasse até à tua mais isolada solidão e te dissesse:
"Esta vida, assim como tu a vives agora e como a viveste, terás de vivê-la ainda uma vez mais e mais vezes sem conta; e não haverá nela nada de novo, cada dor e cada prazer e cada pensamento e suspiro, e tudo o que há de indivisivelmente pequeno e de grande na tua vida te há-de voltar, e tudo na mesma ordem e sequência, e do mesmo modo esta aranha e este luar entre as árvores, e do mesmo modo este instante e eu próprio. A eterna ampulheta da existência será sempre virada outra vez, e tu com ela, ínfimo grão de pó da poeira!".
Não te lançarias ao chão rangendo os dentes e amaldiçoando o demónio que assim te falava?
Ou viveste alguma vez um portentoso instante, em que lhe responderías: "Tu és um deus e nunca ouvi nada mais divino!"
Se esse pensamento adquirisse poder sobre ti, assim como tu és, ele te transformaria e talvez te esmagasse - a questão em relação a tudo e todos, sobre se "Queres tu isto uma vez e mais vezes sem conta?" permaneceria com o maior peso sobre as tuas acções!
Ou, então, como terias de te sentir bem em relação a ti próprio e à vida para não reclamares mais nada senão esta última eterna confirmação, esta última eterna sanção?”
E então, quando acabei de ler, senti-me realmente com o Diabo ao lado, sorridente e enroscado, olhando para mim como para nós todos, que fazemos aqui senão lamentar o que pássa e enterrar a memória até nunca mais.
Há demasiadas coisas que eu quero que aconteçam para desistir das 400 vidas, se nesta tiver a sorte. A Vida (o que fazemos dela), e não o Diabo, é que nos trama o destino.