Pedras Rolantes

"A vida é aquilo que acontece enquanto estás demasiado ocupado a fazer outros planos" John Lennon



"You can't always get what you want, but sometimes, yeah just sometimes, you can get what you need" The Rolling Stones



terça-feira, junho 24, 2008

The Sky is Falling (II)

Será que me perdi? Será que nos perdemos? Será que somos geração rasca, logo existimos? Lembro-me de há dez anos uns de nós mostrarem os seus traseiros a um incompetente ministro, em forma de protesto.
Depois, veio o nome, rasca, geração rasca. Vou referir-me ao grupo onde me incluo, os nados vivos de 1965 a 1975, aqueles que depois de aparecerem os hippies e os yuppies se limitaram a desaparecer. Aqueles que tiveram a infelicidade de nascer tarde demais para perceber que o Homem chegou à Lua e provavelmente não o vão ver chegar a mais lado nenhum. Aqueles que nasceram grudados à RTP1 a preto e branco, e aos Marretas, e à Galactica, que eram mesmo novinhos quando conheceram o E.T. e que ainda hoje sofrem da Síndrome Indiana Jones, insistindo em desenterrar dinossauros e antiguidades, mestres da reciclagem, herdeiros de uma terra sem água, sem petróleo, com guerra, com fome e só com um punhado de dólares.
Ao contrário das gerações precedentes, somos extremamente heterogéneos. Somos na verdade os primeiros orfãos emocionais, os primeiros autistas em larga escala, agora entre os 25 e os 35 anos, que ainda não se aperceberam que são crescidos e podem candidatar-se a Presidentes, não fosse preferirem o Big Brother.
Não nascemos com telemóveis e handycams no berço, mas fomos nós que assistimos às primeiras calinadas dos Nokias, Erikssons, Sonys e Bill Gates deste mundo. Primeiro, havia o BASIC e o Zx Spectrum, agora cada ano que passa saem quatro upgrades dos Pentium, e já podemos dizer que estamos vivos há um milénio.
Somos nós agora a nova força da população activa, pena é sermos cada vez menos e as oportunidades variarem na proporção inversa das necessidades. Somos pessoas habituadas ao status quo, às cotoveladas e às cunhas da vida. De facto não passamos sem elas. Secretamente, pensamos daqui a 25 anos estar num job muito confortável para os boys, com todos a prestarem vassalagem, como nós agora temos que fazer, lamber muitas botas para subir um bocadinho na hierarquia.
Não temos objectivos, não temos sonhos. Quando nascemos, já havia tudo o que precisávamos, vacinas, comida e televisão. Vieram os VHS e os CDs um pouco depois. Infelizmente, já há muito tempo havia políticos.
Para nós, as coisas boas sempre tiveram que ser pagas, desde o algodão doce até ao BMW a prestações. Não temos casa, temos telefone celular, e se as coisas se tornarem mesmo íntimas, temos um email na internet.
Tudo o que é indispensável é portátil, desde o computador aos preservativos, não necessariamente por essa ordem. O que é ilegal, tirando as facturas falsas para o IRS, já não dá gozo. A coca, o hash, a erva já não estão na moda. O ecstasy é para os putos se entreterem. Resta o Big Brother, o futebol e o canal da Playboy.
Não sabemos como nos relacionar, fomos criados em série para competirmos e as palavras amizade e compreensão não vêm nas nossas CPUs. Somos números, bilhetes de identidade, códigos de barras, cartões multibanco, cadastro do Visa.
Passamos a juventude a não nos divertirmos, para podermos seguir o curso que queremos, a marrarmos para conseguirmos acabar o curso possível, a não ligar peva ao trabalho inevitável. Em relação ao trabalho, só lá estamos para subir e sermos chefes. O dia a dia é pior que uma emissão contínua do Big Show Sic.
Perdemos a capacidade de nos divertir; foram-se os filmes, a boa música, as saídas de grupo, ficou o chat virtual, umas cervejinhas e uns shots nas discotecas da moda. Os nossos ícones, se é que temos alguns, são a Bárbara Guimarães ou o Paulo Portas (frios, mediáticos, vaidosos e acima de tudo vazios self-made-tretas). Há muitos de nós como eles.
Até nos casamos, e temos filhos, e nos divorciamos em menos de um ano (não exactamente por essa ordem). Até exibimos com orgulho os nossos respectivos acompanhantes, porque é realmente uma honra acompanharem-nos. Para nós é uma sorte apanhá-los, porque, homens ou mulheres, sentimos o relógio biológico a bater demasiado depressa, quando ainda nem sequer cortámos o cordão umbilical.
Nunca crescemos, e a geração a seguir a nós nem teve a infelicidade de nascer, acordou grudada ao Pokémon. Agora é sempre a descer. O tempo passou ao lado dos telejornais, agora estamos imunizados, nada nos choca, nada é impossível. Até pode haver urânio enriquecido na Assembleia da República. Quem é que se rala?
Caímos na apatia de sermos, mas já não pensarmos nem sonharmos com um futuro bom. Já nascemos tramados e no milénio errado. Ainda não serão fabricados os nossos clones, para podermos bocejar até ao infinito a insustentável leveza do não ser. Ninguém nos salva, porque foram precisamente as outras gerações que nos moldaram assim. Um pacto com Deus, os DVDs e o diabo, aberto por concurso público.
A sério, seremos assim tão maus, ou piores ainda? Esperem pelas gerações Y e Z e depois falamos.
…And I still haven’t found what I’m looking for…
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